Fernando Pessoa escreveu Autopsicografia, um poema que reflete sobre sua identidade como poeta e trata sobre o processo de criação poética.
Em 1 de abril de 1931, versos foram compilados e publicados pela primeira vez na revista Presença número 36, lançada em Coimbra em novembro de 1932.
Fernando Pessoa é um dos maiores poetas da língua portuguesa, cuja obra mais conhecida é a poesia "Autopsicografia".
Veja a seguir uma interpretação dos renomados versos pessoanos.
Autopsicografia - Um Poema na Íntegra
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Análise da Poema Autopsicografia
A psicografia auto consiste na representação de fenômenos psíquicos ou na descrição psicológica de si próprio. Com o uso do termo "auto", procura-se transmitir a noção de si mesmo.
Por meio da palavra "autopsicografia", o autor Fernando Pessoa aborda em sua obra poética algumas características psicológicas. Ele é o poeta ao qual se refere.
No primeiro verso, o poeta usa uma metáfora que o descreve como um fingidor. Esta metáfora não indica que o poeta seja alguém dissimulado ou desonesto, mas sim que é capaz de se transformar de acordo com os sentimentos e emoções dentro dele, transmitindo-os de uma forma única.
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
No senso comum, o termo "fingidor" possui um significado pejorativo. Contudo, nos versos de Fernando Pessoa, a noção de fingimento é apresentada como um instrumento para a criação literária.
De acordo com o dicionário, o verbo "fingir" tem origem no latim, "fingere", cujo significado é "modelar em argila, esculpir, imitar ou reproduzir os traços de algo, representar, imaginar, inventar ou simular".
Explicando a criação dos seus diversos heterônimos, a habilidade de fingir de Fernando Pessoa é bem conhecida. Entre os heterônimos mais famosos de Pessoa, estão Álvaro de Campos, Alberto Caeiro e Ricardo Reis.
Fernando Pessoa tem a capacidade de explorar diversas emoções e se transformar em cada uma delas, criando personagens que possuem características diferentes e um único jeito de viver e experimentar.
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
A segunda estrofe evoca emoções no leitor, que não são exatamente as mesmas que o poeta teve. O que se experimenta é um sentimento de dor relacionado à interpretação do poema. Esta dor não é a mesma que o poeta sentiu quando escreveu, nem a que ele "fingiu" expressar.
O poeta sente uma dor original, que é transformada por ele em uma "dor fingida". Assim, são mencionadas duas dores: a original e a "fingida".
O poeta transforma aquilo que sente em meio à dicotomia entre emoção e razão. Na terceira e última estrofe, o coração é descrito como um comboio de corda que gira e serve para distrair ou divertir a razão. O intelecto então é usado para transformar o sentimento vivenciado em algo novo.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
A autopsicografia atrai o leitor por meio de uma série de repetições e encoraja-o a descobrir mais sobre o poema e seu autor.
Este poema pode ser considerado um metapoema, pois se "dobra sobre si mesmo" e traz à tona as suas próprias engrenagens. O leitor ganha acesso aos bastidores da criação, podendo apreciar seus mecanismos e a beleza de sua construção. O prazer da leitura é ainda maior, pois o poema se explica e compartilha de maneira gentil com o seu público.
Análise da Autopsicografia como Poema
O poema apresenta três estrofes, cada uma delas composta por 4 versos (quartetos). Os versos são rimados em forma de rima cruzada, ou seja, o primeiro e o terceiro verso rimam entre si, assim como o segundo e o quarto.
O poema Autopsicografia é qualificado como um redondilha maior, com versos de heptassílabos, ou seja, compostos por 7 sílabas.
A Autopsicografia: Uma Análise
A revista Presença número 36 foi a publicação inaugural dos consagrados versos de Fernando Pessoa.
O poema original foi escrito em 1 de abril de 1931, tendo a sua edição sido lançada em novembro de 1932, em Coimbra.
Leia mais
- Análise e Comentários dos 10 Poemas Fundamentais de Fernando Pessoa
- Análise e Interpretação do Poema Presságio de Fernando Pessoa
- Poesia de Amor de Fernando Pessoa
Declamação de um poema
O poema Autopsicografia, de Fernando Pessoa, foi declamado pelo grande ator Paulo Autran e está acessível na internet.