8 Grandes Músicas de Raul Seixas


Escrito por Laura Aidar

A figura de Raul Seixas na música e cultura brasileira não pode ser subestimada. Apontado como o "Pai do Rock Nacional", o cantor e compositor se destacava por sua postura de contestação e por suas letras que seguiam uma lógica mística, social e filosófica.

A morte não foi capaz de apagar o sucesso de Raul, sendo que, até os dias de hoje, o artista é visto como um ícone e tem conquistado cada vez mais fãs.

Todos nós reconhecemos o refrão das canções de sucesso de Raul Seixas, mas é importante prestar atenção aos versos e analisar suas mensagens principais. Abaixo, relembramos 8 músicas incríveis do artista.

1. Metamorfose em Movimento (1973)

Eu prefiro ser

Essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião

Formada sobre tudo

Metamorfose Ambulante, presente no primeiro álbum de estreia do artista, Krig-Ha, Bandolo!, é um dos temas mais reconhecidos do seu repertório.

A música de abertura do álbum deu o nome ao projeto: "Cuidado, aí vem o inimigo". Esta expressão é uma referência ao grito de guerra de Tarzan, personagem das histórias em quadrinhos da Editora Brasil-América Limitada (EBAL). A tradução da frase é: "Cuidado, aí vem o inimigo".

A canção aborda o modo de vida do artista, expondo como ele adotou uma postura de rebeldia diante da repressão vigente. Tal postura se manifestou no incentivo à liberdade de pensamento e à conduta livre.

Sobre o que é o amor

Sobre o que eu nem sei quem sou

Se hoje eu sou estrela

Amanhã já se apagou

Se hoje eu te odeio

Amanhã lhe tenho amor

O eu-lírico desafia as expectativas da sociedade, recusando aquilo que é considerado "certo" e "apropriado". Acredita que existem muitas maneiras de viver e olhar para o mundo, e não um único caminho a ser seguido.

Esta é uma declaração de mudança e transformação contínua. O sujeito tem uma mentalidade aberta, rejeitando a rigidez das "velhas crenças formadas sobre tudo". Este indivíduo está aberto para aprender novas ideias e opiniões a cada nova experiência.

Ele decidiu se tornar uma "metamorfose ambulante", ou seja, alguém sempre pronto a se desenvolver e evoluir durante sua caminhada.

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2. A Mosca na Sopa (1973)

Eu sou a mosca que pousou em sua sopa

Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar

Eu sou a mosca que perturba o seu sono

Eu sou a mosca no seu quarto a zumbizar

Em plena ditadura militar, Raul Seixas denunciava o clima de opressão vivido pelo brasileiro através do seu álbum "Mosca na Sopa", com lirismo e criativas metáforas. A obra permitiu que ele driblasse a censura.

A mosca é utilizada como uma representação das forças militares na música, que pareciam estar por toda parte, ameaçando, rastreando e perseguindo.

No entanto, essa mosca é vista de forma diferente, não como algo perigoso e assustador, mas algo chato e irritante. Ela parece invencível, pois mesmo depois de matar uma, logo surge outra para tomar seu lugar. É impossível derrotar essa mosca.

Eu tô sempre junto de você

Água mole em pedra dura

Tanto bate até que fura

Quem, quem é?

A mosca, meu irmão

O sujeito não consegue expressar-se livremente, sutilmente sinalizando ao governo repressor. A letra é insistente em sua mensagem de perseguição, desejando, assim, que o ouvinte apreenda o que o músico está tentando comunicar.

A expressão "mosca na sopa" também se refere à resistência dos artistas, especialmente de Raul, que fazem de tudo para desafiar e confrontar.

Apesar de serem perseguidos, censurados e exilados, aqueles que se mantinham fiéis à liberdade seguiam sendo uma "pedra no sapato" do autoritarismo.

3. A Busca do Ouro de Tolo (1973)

Eu devia estar contente

Porque eu tenho um emprego

Sou um dito cidadão respeitável

E ganho quatro mil cruzeiros por mês

Durante os "anos de chumbo" da ditadura militar, houve um aumento significativo no crescimento econômico, o que contribuiu para a acumulação de riqueza e a desigualdade social aumentou entre a população.

O governo autoritário divulgava com grande ênfase o que denominava de "milagre econômico", com o propósito de apresentar o Brasil como uma potência mundial. Para isso, a classe média foi atraída pelo estilo de vida mais elevado, bem como pela aquisição de bens materiais, como automóveis e imóveis.

No início do poema, o sujeito lírico expõe sua insatisfação com o que lhe foi dado, afirmando que não se contenta com tão pouco. Questionando a vida cotidiana dos cidadãos comuns, o eu-lírico instiga seus ouvintes a buscar algo mais: não deixem de lutar por "coisas grandes / para conquistar".

Eu devia estar feliz pelo Senhor

Ter me concedido o domingo

Pra ir com a família ao Jardim Zoológico

Dar pipoca aos macacos

Ah, mas que sujeito chato sou eu

Que não acha nada engraçado

Macaco, praia, carro, jornal, tobogã

Eu acho tudo isso um saco

Assim, Raul Seixas está incentivando o povo brasileiro a lutar pelos seus direitos e pela democracia.

A expressão "Ouro de Tolo" pode ser interpretada como referência aos alquimistas que acreditavam ser capazes de transformar o chumbo em ouro, sendo, portanto, um símbolo de sua falta de conhecimento.

O sujeito da letra reforça que a vida é mais importante do que bens materiais e pequenos momentos de conforto, rejeitando assim uma postura apática e conformista.

Eu que não me sento

No trono de um apartamento

Com a boca escancarada cheia de dentes

Esperando a morte chegar

Em junho de 1973, Paulo Coelho e um amigo convocaram a imprensa para divulgar a Sociedade Alternativa. O lançamento do tema foi feito em escala nacional, o que abriu caminho para futuras discussões a respeito daquela iniciativa.

A letra contendo comentários políticos e sociais, apesar de sérios riscos de censura, conseguiu um grande sucesso.

4. O Medo da Chuva (1974)

É pena que você pense que eu sou seu escravo

Dizendo que eu sou seu marido e não posso partir

Como as pedras imóveis na praia eu fico ao teu lado

Sem saber

Dos amores que a vida me trouxe e eu não pude viver

Composta por Raul Seixas e Paulo Coelho, Medo da Chuva reflete sobre um dos principais alicerces da sociedade conservadora de sua época: o casamento.

O sujeito se dirige diretamente à esposa, expressando seus sentimentos sobre o relacionamento. Ele inicia a letra deixando claro que sente estar aprisionado a ela, submetido à sua vontade.

O eu-lírico questiona a ideia da monogamia como única maneira adequada de se amar, pois imagina todos os envolvimentos amorosos que ficaram para trás ao optar por se comprometer com uma única pessoa "para sempre".

Eu perdi o meu medo, o meu medo, o meu medo da chuva

Pois a chuva voltando pra terra traz coisas do ar

Aprendi o segredo, o segredo, o segredo da vida

Vendo as pedras que choram sozinhas no mesmo lugar

No refrão, o sujeito confessa que conquistou sua liberdade da tristeza, nostalgia e solidão que a chuva costuma evocar. Esta conquista é interpretada como o fato de não ter mais medo da chuva.

Atravessando um processo doloroso, o eu-lírico se liberta. Ele tem o direito de viver exatamente como deseja, porém, também precisa descobrir o modo de se manter em equilíbrio sozinho.

5. Uma Sociedade Alternativa: 1974

Se eu quero e você quer

Tomar banho de chapéu

Ou esperar Papai Noel

Ou discutir Carlos Gardel

Então, vá

Faze o que tu queres

Pois é tudo da lei, da lei

Raul Seixas e Paulo Coelho criaram a música Sociedade Alternativa para contar a história de um projeto utópico de construção de uma comunidade.

Contrapondo-se ao controle exercido pelo regime autoritário, ali todos seriam livres e poderiam selecionar suas próprias decisões.

A criação baseou-se nos ensinamentos do mago e ocultista inglês Aleister Crowley, sendo sua lei de Thelema destacada: "Faze o que quiseres, será o todo da Lei".

Essa é a nossa lei e a alegria do mundo

(Viva a Sociedade Alternativa!)

Viva, viva, viva!

Sociedade Alternativa foi mais do que uma simples canção: ela serviu como um movimento de despertar, que fez com que as pessoas pensassem na possibilidade de criar uma vida fora do sistema opressor.

Seixas e Coelho eram parceiros na arte e tinham fé em comunidades alternativas e esotéricas. Eles se comprometeram a documentar a sua Sociedade, o que ocorreu entre 1972 e 1976 no cartório.

6. Tentativa Número Dois: 1975

Não diga que a canção está perdida

Tenha fé em Deus, tenha fé na vida

Tente outra vez

A emocionante canção Tente outra vez, de Raul Seixas, foi criada em parceria com Marcelo Motta e Paulo Coelho como uma homenagem ao amigo Geraldo Vandré. Ela nos revela uma importante lição de resiliência.

1968 foi um ano de enorme repressão. Em meio a isso, o músico Caetano Veloso concorreu ao Festival da Canção com Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores, um dos hinos mais importantes da resistência. O tema foi bem aceito pelo público, mas o governo de repressão interveio e impediu a vitória de Vandré.

Basta ser sincero e desejar profundo

Você será capaz de sacudir o mundo, vai

Tente outra vez,

E não diga que a vitória está perdida

Se é de batalhas que se vive a vida

Tente outra vez

No texto, o narrador incentiva quem está escutando a não desistir, mesmo nas piores situações. Ele transmite a mensagem de força e motivação, lembrando ao ouvinte, seja Vandré ou qualquer outra pessoa, que é possível perseverar diante das maiores perdas e injustiças.

"Levante sua mão sedenta e recomece a andar": essa é a mensagem que nos é transmitida, a de que, mesmo no meio de desafios e decepções, somos capazes de não desistir e seguir em frente com otimismo. É importante manter o foco nos seus objetivos e continuar lutando.

7. Data de Nascimento: 10 mil Anos Atrás - 1976

Eu vi um velhinho sentado na calçada

Com uma cuia de esmola

E uma viola na mão

O povo parou para ouvir

Ele agradeceu as moedas

E cantou essa música

Que contava uma história

Que era mais ou menos assim

Um dos clássicos de Raul Seixas e Paulo Coelho é I Was Born About Ten Thousand Years Ago. Esta música é inspirada num tema norte-americano com o mesmo título.

É uma canção clássica do country que Elvis Presley adaptou e gravou em 1972. Ela conta a história de um homem que canta na rua para ganhar algum dinheiro. Nos versos, ele descreve tudo o que viu e presenciou ao longo de sua vida.

A letra de "Metamorfose Ambulante", de Raul Seixas, é recheada de referências bíblicas, incluindo Cristo, Moisés e Maomé. No entanto, a canção vai muito além disso.

Eu nasci

Há dez mil anos atrás

E não tem nada nesse mundo que eu não saiba demais

A Inquisição queimou muitas bruxas na fogueira, e a umbanda, uma religião brasileira, ainda é vista com suspeita. Ela é ligada a símbolos que muitos desconhecem ou consideram pouco ortodoxos.

Ao longo da História do Brasil e do mundo, houve grandes acontecimentos como o Quilombo dos Palmares e o domínio de Hitler na Europa.

Raul nutre a ideia de que é um guru e mago com sabedoria ancestral, como se estivesse presente desde o início dos tempos, observando tudo de longe.

8. Beleza Maluca (1977)

Enquanto você se esforça pra ser

Um sujeito normal e fazer tudo igual

Eu do meu lado, aprendendo a ser louco

Um maluco total, na loucura real

Maluco Beleza, sucesso de Raul Seixas, é considerado um dos maiores hits do ícone da música brasileira. O título da música acabou sendo um dos apelidos carinhosos pelos quais ele é chamado carinhosamente pelos seus fãs.

Apesar de ter uma letra aparentemente simples, a música transmite uma mensagem revolucionária acerca da forma como lidamos com o mundo. Num mundo em que os padrões e aparências são tão importantes, o sujeito enfatiza o seu desejo em rejeitar tudo isso.

Ele se distingue do ouvinte "normal", que faz o que lhe foi ordenado. Pelo contrário, ele prefere viver do seu jeito, mesmo que seja considerado um louco.

E esse caminho que eu mesmo escolhi

É tão fácil seguir por não ter onde ir

O eu-lírico aborda a necessidade de equilibrar a "maluquez" e a "lucidez" para desafiar as expectativas dos outros. Esta parece ser a mensagem que mais marca as pessoas nestes dias, tornando-se a sua música mais escutada.

Raul questiona as noções de saúde mental existentes na sociedade atual. Então, o que é um Maluco Beleza? Embora não haja uma definição precisa, podemos dizer que é alguém que não se preocupa em ser "diferente" para alcançar a felicidade.

A Vida de Raul Seixas

Raul Seixas, nascido em Salvador no dia 28 de junho de 1945, foi um músico de grande destaque. Ele foi cantor, compositor, produtor musical e um habilidoso instrumentista. Infelizmente, faleceu em 21 de agosto de 1989.

Raul Seixas é indiscutivelmente apontado como o Pai do Rock Brasileiro, sendo que sua influência é notável nos artistas posteriores. A sonoridade única criada por ele misturava influências estrangeiras com ritmos brasileiros. Seu legado na música é incontestável.

Retrato de Raul Seixas.

Conhecido também como "Raulzito" ou "Maluco Beleza", Raul Seixas tornou-se um ícone da cultura brasileira. Suas letras eram complexas e questionamentos radicais em comparação à época em que viveu.

Durante a ditadura militar, o artista teve a coragem de lançar músicas de protesto, tais como Ouro de Tolo, Mosca na Sopa e Sociedade Alternativa.

Paulo Coelho e a Sociedade Alternativa que ele projetou e fundou foram vistos como uma ameaça ao governo e, como resultado, ambos foram detidos, torturados e exilados.

Raul Seixas é muito mais do que um dos maiores nomes da resistência - ele é uma voz da liberdade e um expoente desta causa.

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Laura Aidar
Escrito por Laura Aidar

É arte-educadora, artista visual e fotógrafa. Possui licenciatura em Educação Artística pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e formação em Fotografia pela Escola Panamericana de Arte e Design.