Aquarela, lançada no início dos anos oitenta, traz à tona lembranças da infância. Ela nos ensina a usar nossa imaginação e criatividade para descobrir novos locais, além do que é possível ver. É uma oportunidade para curtirmos a beleza da criação.
Muito poucos sabem, mas a composição foi inicialmente divulgada na Itália, onde teve enorme aceitação. Somente posteriormente foi traduzida e adaptada para o português por Toquinho, que também é autor da versão original.
Aquarela teve grande reconhecimento no nosso país, e foi ainda mais destacada quando foi escolhida como trilha sonora de um anúncio de destaque lançado pela Faber-Castell, marca alemã de lápis, em 1984.
Analisando a Letra
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo
Corro o lápis em torno da mão e me dou uma luva,
E se faço chover, com dois riscos tenho um guarda-chuva
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel,
Num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu
Vai voando, contornando a imensa curva norte e sul,
Vou com ela, viajando, Havaí, Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela branco, navegando,
É tanto céu e mar num beijo azul
Entre as nuvens vem surgindo um lindo avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo, com suas luzes á piscar
Basta imaginar que ele está partindo, sereno, lindo,
E se a gente quiser, ele vai pousar
Numa folha qualquer eu desenho um navio de partida
Com alguns bons amigos bebendo de bem com a vida
De uma américa a outra consigo passar num segundo,
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo
Um menino caminha e caminhando chega no muro
E ali logo em frente, a esperar pela gente, o futuro está
E o futuro é uma astronave que tentamos pilotar,
Não tem tempo nem piedade, nem tem hora de chegar
Sem pedir licença muda nossa vida, depois convida a rir ou chorar
Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar
Vamos todos numa linda passarela
De uma aquarela que um dia, enfim, descolorirá
(que descolorirá)
(que descolorirá)
(que descolorirá)
Explorando a Letra
A letra de Aquarela é longa e não tem refrão, o que poderia ser um empecilho para o sucesso da canção, porém isso não a impediu de conquistar um ótimo reconhecimento.
Como se estivesse contando uma lenda antiga, o eu-lírico evoca lembranças no ouvinte que gera sentimentos profundos.
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo
Corro o lápis em torno da mão e me dou uma luva,
E se faço chover, com dois riscos tenho um guarda-chuva
Convocados através de versos, somos levados de volta à imaginação infantil, que nos permite criar imagens e cenários a partir do nada.
A partir de poucas linhas, a criança utiliza seus lápis de cor para criar um mundo de possibilidades. Utilizando ferramentas básicas como as linhas e o colorido dos lápis, ela cria um universo próprio.
Tudo parece tranquilo, sem pressa, e o narrador escolhe se divertir – como um construtor – criando cenários possíveis ou mesmo descrevendo objetos simples.
A canção de Toquinho se fundamenta na brincadeira, palavra-chave para se compreender o seu universo lúdico. Assim, ela apela para o nosso instinto criador.
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel,
Num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu
Os versos acima são memoráveis para crianças e adultos, pois narram os imprevistos que acontecem no mundo infantil - criando, assim, uma conexão especial entre o pequeno ouvinte e os seus problemas, bem como aqueles que os adultos recordam da sua própria infância.
Quantas vezes, ao desenhar, não acabamos manchando o papel de forma acidental? No entanto, isso nos impulsiona a usar a nossa imaginação, encontrando uma solução rápida para o empecilho que se colocou.
A letra apresenta aos ouvintes a amplitude do mundo, provocando a imaginação para explorar e descobrir os quatro cantos do planeta, cruzando fronteiras.
Vai voando, contornando a imensa curva norte e sul,
Vou com ela, viajando, Havaí, Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela branco, navegando,
É tanto céu e mar num beijo azul
Entre as nuvens vem surgindo um lindo avião rosa e grená
Para realizar esta aventura, o eu-lírico fabricou os seus próprios meios de deslocamento: inicialmente uma embarcação a vela, e em seguida, um avião.
Sublinhar a relevância das cores na pintura de Toquinho é também importante. Ele busca dar vida às paisagens que desenha, com suas cores, a todo momento.
Verifique como os substantivos são acompanhados por cores: o barco a vela tem a cor branca, o beijo é azul, e o avião é rosa e grená.
Tudo em volta colorindo, com suas luzes á piscar
Basta imaginar que ele está partindo, sereno, lindo,
E se a gente quiser, ele vai pousar
É destacável que essa viagem será uma jornada única acompanhada apenas pela imaginação da criança. Não haverá mais ninguém para tomar parte nessa experiência.
A Mestra de todo o universo, que assim rege e canta, cujos desígnios scolhem se o avião parte ou pousa; ela é a Criadora deste mundo inteiro.
Toquinho apresenta alguns ensinamentos fundamentais para o futuro adulto:
Numa folha qualquer eu desenho um navio de partida
Com alguns bons amigos bebendo de bem com a vida
De uma América a outra consigo passar num segundo,
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo
Os versos fazem-nos compreender que todos os elementos da vida têm um começo e um fim, e que tudo é apenas temporário. É necessário aproveitar o presente enquanto é possível, pois nem tudo dura para sempre.
A imaginação humana é formidável, permitindo que viajemos rapidamente a outros lugares. Esta capacidade criativa do ser humano nos permite explorar inúmeras possibilidades de futuro.
O encontro entre amigos é ressaltado como algo que trás descanso e prazer diante da rotina estressante do adulto. O eu-lírico destaca que o que realmente importa é estar em sintonia com aqueles que te fazem bem, de maneira divertida e descontraída.
A seguinte passagem sugere o que está por vir:
Um menino caminha e caminhando chega no muro
E ali logo em frente, a esperar pela gente, o futuro está
E o futuro é uma astronave que tentamos pilotar,
Não tem tempo nem piedade, nem tem hora de chegar
Sem pedir licença muda nossa vida, depois convida a rir ou chorar
Houve uma menção ao futuro pela primeira vez, relacionada à ideia de se impossibilitar de ser controlado e domado.
Neste momento, o menino entende que não tem controle sobre tudo o que acontecerá, e que o seu destino não depende apenas do que ele deseja.
Quando a criança era pequena, a desenhar era uma forma de controlar seus próprios mundos paralelos. No entanto, à medida que ela vai crescendo, ela percebe que tem pouco controle sobre aquilo que acontece ao seu redor.
Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar
Vamos todos numa linda passarela
De uma aquarela que um dia, enfim, descolorirá
A morte, o fim último, é tratado com grande compaixão, pois é vista como parte fundamental da vida.
No fim, é possível observar o desvanecimento da figura, revelando a insignificância humana diante do futuro incerto, contudo, somos presenteados com uma belíssima cena de uma ponte de aquarela, plena de cor e energia.
Ao ouvir a canção Aquarela, o leitor imediatamente revive sua infância e relembra com saudade os momentos que não voltarão.
A música nos remete à infância, mas também nos faz refletir sobre a fugacidade da vida e do tempo.
Uma Revisão da História da Música
Toquinho, brasileiro, e Maurizio Fabrizio, italiano, formam uma parceria cujo resultado é a música Aquarela.
Quando Maurizio Fabrizio chegou ao Brasil para trabalhar com Toquinho, ele mostrou um trecho de uma música que havia composto durante um dos encontros. Foi assim que tudo começou.
O compositor brasileiro ficou perplexo ao descobrir que sua obra era tão semelhante a aquela criada em parceria com o poeta Vinicius de Moraes algum tempo antes.
A coincidência fez com que Toquinho e Maurizio decidissem unir as músicas que cada um havia criado em seu país de origem.
A letra italiana Acquarello foi desenvolvida especialmente para a ocasião. Logo após seu lançamento na Itália, se tornou um grande sucesso no mercado.
Ouça Toquinho cantando a versão italiana da música. Confira o áudio!
Depois de Acquarello se tornar muito famosa na Itália, Toquinho traduziu e adaptou a música e a divulgou no Brasil.
Inicialmente, Toquinho temeu que Aquarela não teria sucesso no Brasil por conta da letra longa e da ausência de um refrão. Porém, o lançamento da música trazia consigo grandes expectativas e, como resultado, Aquarela se tornou um grande êxito.
A canção foi recebida muito bem pelo público, e sua fama foi ainda mais impulsionada por dois fatores externos: Aquarela foi tema de uma novela da Globo protagonizada por Dina Sfat (sendo que, para essa ocasião, a letra foi modificada) e foi tema do comercial da Faber-Castell, que contribuiu para divulgar ainda mais a música.
Anúncio da Faber-Castell
O comercial famoso da empresa de lápis Faber-Castell do ano de 1984 usava a canção de Toquinho.
Ao longo do comercial, os cenários descritos na canção ganham vida e cor. O traço do desenho acompanha a melodia da música e transforma o que antes era apenas imaginação em realidade.
Em 2018, a marca alemã convidou Toquinho novamente para divulgar a marca e adaptar a canção.
Ao compor a letra, o compositor destacou a diversidade racial do Brasil, que foi reforçada com o lançamento de um novo comercial.
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