1. Fidelidade em Soneto
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa lhe dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure
Soneto de Fidelidade, um dos poemas mais conhecidos do escritor brasileiro, foi escrito no Estoril, Portugal, em outubro de 1939 e publicado em 1946, na coletânea Poemas, Sonetos e Baladas.
O amor é um dos temas mais presentes na obra de Vinicius de Moraes. O poeta utiliza a forma clássica do soneto para contar a lealdade que sentimos por aqueles a quem amamos. Ao escrever sobre este sentimento, destaca-se a vontade de protegermos o nosso amado e a força que o amor tem para vencer todas as barreiras que surgem.
O poema nos lembra que devemos aproveitar ao máximo esse sentimento, pois, como os últimos versos indicam, o amor não é eterno, apesar do que os românticos geralmente supõem.
Vinicius de Moraes nos ensina que, enquanto a chama está acesa, devemos aproveitar ao máximo. Em 14 versos, ele nos mostra como aproveitar o tempo enquanto podemos.
2. A Doçura da Ternura
Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma…
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora.
Em 1938, escrito no Rio de Janeiro, Ternura foi vista através da perspectiva do amor romântico, idealizado. O poema abriu com uma desculpa à amada por ter-lhe sido oferecido esse sentimento tão intenso e repentino.
O poeta confessa seu amor intenso por sua amada e promete uma devoção incondicional. Ela, por sua vez, deve permitir que esse sentimento profundo a invada.
3. O Amor Total em um Soneto
Amo-te tanto, meu amor… não cante
O humano coração com mais verdade…
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade
Amo-te afim, de um calmo amor prestante,
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.
Amo-te como um bicho, simplesmente,
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.
E de te amar assim muito e amiúde,
É que um dia em ter corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.
Em 1951, no Rio de Janeiro, Vinicius de Moraes escreveu o Soneto do amor total. Utilizando o formato clássico do soneto, o poeta tentou, em apenas 14 versos, traduzir o intenso sentimento de amor que nutria pela sua amada.
No poema, o sujeito expressa sua angústia por não conseguir traduzir em palavras todo o amor que sente. Ele quer ser capaz de expressar a profundidade do seu afeto para a amada.
O poema nos mostra o amor em sua complexidade e multiplicidade de nuances, variando desde a calma e serena amizade até o desejo animal e a necessidade urgente de possuir a outra pessoa.
Ao terminar o poema, nota-se que o sujeito possui um amor intenso, tão intenso que, de certa maneira, tem temor de se afogar nele.
4. Amor que Sempre Durará
Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar
Em cada despedida eu vou te amar
Desesperadamente
Eu sei que vou te amar
E cada verso meu será pra te dizer
Que eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida
Eu sei que vou chorar
A cada ausência tua eu vou chorar,
Mas cada volta tua há de apagar
O que essa ausência tua me causou
Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver a espera
De viver ao lado teu
Por toda a minha vida.
Vinicius de Moraes foi responsável pela letra de "Eu sei que vou te amar", que tornou-se ainda mais famosa quando foi musicada por Tom Jobim. Neste poema a certeza do sentimento do poeta é evidente, e a consciência de que esse afeto estará presente para sempre é comovente.
Ele afirma que seu amor é tão intenso que fica em lágrimas toda vez que ela se afasta, mas que o seu coração se enche de alegria quando ela retorna.
Ele está completamente enamorado e demonstra ser dedicado à amada, sendo a relação um componente fundamental da sua vida.
5. Um Amor para Você
O amor é o murmúrio da terra
quando as estrelas se apagam
e os ventos da aurora vagam
no nascimento do dia...
O ridente abandono,
a rútila alegria
dos lábios, da fonte
e da onda que arremete
do mar...
O amor é a memória
que o tempo não mata,
a canção bem-amada
feliz e absurda...
E a música inaudível...
O silêncio que treme
e parece ocupar
o coração que freme
quando a melodia
do canto de um pássaro
parece ficar...
O amor é Deus em plenitude
a infinita medida
das dádivas que vêm
com o sol e com a chuva
seja na montanha
seja na planura
a chuva que corre
e o tesouro armazenado
no fim do arco-íris.
Neste poema, A você, com amor, o poeta se esforça para compreender o amor através de um olhar poético.
Ao tentar descrever o amor, ele recorre a definições subjetivas, como "o murmúrio da terra", "os ventos da aurora", "a memória que o tempo não mata" e "Deus em plenitude". Estas metáforas evocam a complexidade do sentimento, que é difícil de ser nomear e traduzir.
O título escolhido por Vinicius de Moraes expressa o sentimento de que se trata de um poema-presente, revelando que a obra foi redigida com o objetivo de homenagear a mulher amada.
6. Sentindo a Falta
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei… tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.
Em 1935, Ausência, escrito no Rio de Janeiro, é um poema que retrata a melancolia e a determinação do sujeito de não prosseguir com o sentimento amoroso.
Neste poema, o amor é exaltado, mesmo que o casal não tenha ficado juntos. É um dos raros casos na obra do poeta, onde o amor não é retratado como uma declaração feita dentro de um relacionamento bem-sucedido.
Ele desejava com todas as suas forças ter a mulher amada, mas acabou desistindo da relação para não causar sofrimento. Optando por guardar o seu amor e padecer em segredo, o poeta se colocou diante de um sacrifício em nome da outra pessoa, para não submetê-la à dor.
7. O Mais Puro Amor em Soneto
Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.
E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.
Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer - e vive a esmo
Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo.
Em 1938, Oxford foi a cenário para o Soneto do amor maior, que versa sobre um amor único e particular. Esta emoção inicialmente é descrita através de paradoxos (quando alegre fica triste e, quando descontente, dá risada).
Ao longo dos versos, é revelado que o sujeito prefere uma vida agitada e cheia de aventuras, optando por viver uma paixão louca ao invés de um vida calma e serena.
O poeta não está procurando por alguém em específico, mas sim por uma emoção intensa que lhe dê a sensação de estar arrebatado por um amor ardente. A busca é por uma paixão capaz de transformar a vida sentimental, enchendo-a de alegria.
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8. A Magia do Amor
Vamos brincar, amor? vamos jogar peteca
Vamos atrapalhar os outros, amor, vamos sair correndo
Vamos subir no elevador, vamos sofrer calmamente e sem precipitação?
Vamos sofrer, amor? males da alma, perigos
Dores de má fama íntimas como as chagas de Cristo
Vamos, amor? vamos tomar porre de absinto
Vamos tomar porre de coisa bem esquisita, vamos
Fingir que hoje é domingo, vamos ver
O afogado na praia, vamos correr atrás do batalhão?
Vamos, amor, tomar thé na Cavé com madame de Sevignée
Vamos roubar laranja, falar nome, vamos inventar
Vamos criar beijo novo, carinho novo, vamos visitar N. S. do Parto?
Vamos, amor? vamos nos persuadir imensamente dos acontecimentos
Vamos fazer neném dormir, botar ele no urinol
Vamos, amor?
Porque excessivamente grave é a Vida.
No poema Amor, Vinicius de Moraes convida a pessoa amada por meio de versos livres e sem rima. Inicialmente, ele faz as perguntas habituais que quem está apaixonado costuma fazer (“vamos brincar, amor?”). Em seguida, o poeta enumera diversas situações corriqueiras que os casais que estão começando um relacionamento normalmente experimentam, como atrapalhar-se mutuamente e sair correndo.
Após isso, o poeta se questiona de maneira não convencional, chocando o leitor e lembrando que toda relação envolve tanto alegria quanto dor ("vamos sofrer, amor?").
O poema, após mostrar variadas situações (algumas alegres e outras não tão boas), conclui que devemos aproveitar o que a vida nos oferece, pois ela é, de fato, dura.
9. Ela Entrou no Museu de Memórias como um Pássaro
Ela entrou como um pássaro no museu de memórias
E no mosaico em preto e branco pôs-se a brincar de dança.
Não soube se era um anjo, seus braços magros
Eram muito brancos para serem asas, mas voava.
Tinha cabelos inesquecíveis, assim como um nicho barroco
Onde repousasse uma face de santa de talha inacabada.
Seus olhos pesavam-lhe, mas não era modéstia
Era medo de ser amada; vinha de preto
A boca como uma marca do beijo na face pálida.
Reclinado; nem tive tempo de a achar bela, já a amava.
Ela entrou no museu de memórias, como um pássaro carregando belas imagens. Vinicius de Moraes criou ali um dos mais belos poemas de amor, escrito em verso livre, sem rima. O poema é, na verdade, um grande elogio à mulher amada.
O poeta compara a pessoa que roubou seu coração a um pássaro. Ele fala sobre a forma inesperada como ela surge, assim como as aves, e sua pele, branca como asas.
No entanto, entre os dois existe uma diferença crucial: ela sente medo de se entregar ao sentimento, enquanto ele já parece totalmente encantado e sem alternativa.
10. Para Uma Mulher
Quando a madrugada entrou eu estendi o meu peito nu sobre o teu peito
Estavas trêmula e teu rosto pálido e tuas mãos frias
E a angústia do regresso morava já nos teus olhos.
Tive piedade do teu destino que era morrer no meu destino
Quis afastar por um segundo de ti o fardo da carne
Quis beijar-te num vago carinho agradecido.
Mas quando meus lábios tocaram teus lábios
Eu compreendi que a morte já estava no teu corpo
E que era preciso fugir para não perder o único instante
Em que foste realmente a ausência de sofrimento
Em que realmente foste a serenidade.
Em 1933, no Rio de Janeiro, A uma mulher é uma composição que retrata, ao mesmo tempo, um profundo sentimento de amor e a separação do casal.
Os versos expressam a sensibilidade dessa separação definitiva entre dois parceiros, bem como o impacto que ela causou. É possível sentir a emoção nos últimos momentos de sua relação.
Mesmo tentando se aproximar dela, com carinho e gratidão pelos momentos vividos juntos, ela rejeita-o, como se a relação já tivesse sido esquecida. Inspirado nessa triste história, o poema é tanto uma demonstração de tristeza quanto de beleza que acompanham a despedida de um amor.
11. A Poesia Intensa da Mulher Amada
Longe dos pescadores os rios infindáveis vão morrendo de sede lentamente…
Eles foram vistos caminhando de noite para o amor - oh, a mulher amada é como a fonte!
A mulher amada é como o pensamento do filósofo sofrendo
A mulher amada é como o lago dormindo no cerro perdido
Mas quem é essa misteriosa que é como um círio crepitando no peito?
Essa que tem olhos, lábios e dedos dentro da forma inexistente?
Pelo trigo a nascer nas campinas de sol a terra amorosa elevou a face pálida dos lírios
E os lavradores foram se mudando em príncipes de mãos finas e rostos transfigurados…
Oh, a mulher amada é como a onda sozinha correndo distante das praias
Pousada no fundo estará a estrela, e mais além.
No poema A brusca poesia da mulher amada, escrito no Rio de Janeiro em 1938, o poeta busca descrever a pessoa que inspira o seu amor.
O poeta recorre à comparação para descrever a amada: ela é como uma fonte, como os pensamentos angustiados de um filósofo, como um lago dormindo sobre um morro distante.
Ele não está tentando descrever a mulher amada a partir do seu aspecto físico, mas sim descrevê-la pelas sensações e sentimentos que ela evoca.
12. A Passagem da Mulher
Meu Deus, eu quero a mulher que passa.
Seu dorso frio é um campo de lírios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na boca fresca!
Oh! Como és linda, mulher que passas
Que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias!
Teus sentimentos são poesia
Teus sofrimentos, melancolia.
Teus pêlos leves são relva boa
Fresca e macia.
Teus belos braços são cisnes mansos
Longe das vozes da ventania.
Meu Deus, eu quero a mulher que passa!
Como te adoro, mulher que passas
Que vens e passas, que me sacias
Dentro das noites, dentro dos dias!
Neste trecho do poema de Vinicius de Moraes, A mulher que passa, o poeta faz elogios à mulher que cativou seu olhar e coração.
Não sabemos quem é essa mulher, qual é seu nome ou o que ela faz. Entretanto, o poeta mostra o enorme impacto que ela causa nele. O tema do poema, e seu próprio título, se relacionam com algo efêmero e passageiro: a mulher que passa e deixa o poeta admirado.
Romance está no ar quando o poeta escreve sua prece, louvando a beleza e a personalidade da amada. Ele deseja captar o momento, eternizando o afeto entre os dois.
13. A Deliciosa Carne
Que importa se a distância estende entre nós léguas e léguas
Que importa se existe entre nós muitas montanhas?
O mesmo céu nos cobre
E a mesma terra liga nossos pés.
No céu e na terra é tua carne que palpita
Em tudo eu sinto o teu olhar se desdobrando
Na carícia violenta do teu beijo.
Que importa a distância e que importa a montanha
Se tu és a extensão da carne
Sempre presente?
Apesar de os amados estarem distantes fisicamente, a carne se tornou um poema de amor que fala sobre saudade. Entre eles existe uma comunhão, um elo que os une mesmo com a distância.
Observando poéticamente, o sujeito nota que estão unidos compartilhando o mesmo céu que os cobre e ligados à mesma terra que têm embaixo dos pés. Essa realidade o faz concluir que, apesar de se encontrarem distantes um do outro, estão permanentemente juntos, pois ela é parte da sua carne, logo está sempre presente.
14. Soneto de Arrependimento
Eu te amo, Maria, te amo tanto
Que o meu peito me dói como em doença
E quanto mais me seja a dor intensa
Mais cresce na minha alma teu encanto.
Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa.
Não é maior o coração que a alma
Nem melhor a presença que a saudade
Só te amar é divino, e sentir calma…
E é uma calma tão feita de humildade
Que tão mais te soubesse pertencida
Menos seria eterno em tua vida.
A Maria, o poeta declara seu amor através do Soneto de contrição. Ele busca dimensionar seu afeto, descrevendo-o como se fosse uma doença que doí no peito. Assim, a amada pode entender o tamanho do sentimento que o poeta sente por ela.
Vinicius de Moraes escolheu o clássico formato do soneto para traduzir a entrega de seu amado a Maria.
Ele é completamente governado pelo sentimento, mesmo ciente de que o amor causa dor. O poeta expressa a sua devoção por Maria em rimas, revelando a sua ligação com a dependência afetiva.
15. Canção
Não, tu não és um sonho, és a existência
Tens carne, tens fadiga e tens pudor
No calmo peito teu. Tu és a estrela
Sem nome, és a morada, és a cantiga
Do amor, és luz, és lírio, namorada!
Tu és todo o esplendor, o último claustro
Da elegia sem fim, anjo! mendiga
Do triste verso meu. Ah, fosses nunca
Minha, fosses a ideia, o sentimento
Em mim, fosses a aurora, o céu da aurora
Ausente, amiga, eu não te perderia! (...)
No Cântico, Vinicius de Moraes glorifica sua amada, descrevendo-a como se fosse um sonho de tão perfeita que é. Seu elogio é tamanho que parece pintar uma imagem quase que irreal.
No primeiro verso, o poeta esclarece que aquela mulher não é fruto de imaginação, mas sim de algo real, de alguém com presença concreta. Portanto, não há mais dúvidas a serem esclarecidas.
Aqui, a mulher é celebrada como a principal fonte de alegria e beleza devido às emoções agradáveis que ela provoca.
16. Três Pavimentos de Amor
Eu não sei tocar, mas se você pedir
Eu toco violino fagote trombone saxofone.
Eu não sei cantar, mas se você pedir
Dou um beijo na lua, bebo mel himeto
Pra cantar melhor.
Se você pedir eu mato o papa, eu tomo cicuta
Eu faço tudo que você quiser.
Você querendo, você me pede, um brinco, um namorado
Que eu te arranjo logo.
Você quer fazer verso? É tão simples!... você assina
Ninguém vai saber.
Se você me pedir, eu trabalho dobrado
Só pra te agradar.
Se você quisesse!... até na morte eu ia
Descobrir poesia.
Te recitava as Pombas, tirava modinhas
Pra te adormecer.
Até um gurizinho, se você deixar
Eu dou pra você...
Com o objetivo de demonstrar o seu profundo amor, o poeta define, nos versos, todas as ações que realizaria pela sua amada, abarcando tanto o possível quanto o impossível.
Apaixonado, ele não hesitaria em realizar todos os desejos de sua amada, mesmo que isso significasse tocar instrumentos sem saber, ou até mesmo matar o papa ou a si próprio.
Terminando os seus versos, o poeta promete até oferecer uma criança, se a amada permitir. Este oferecimento exemplifica o quão ilimitado seu amor é, ofertando tudo o que há no mundo.
17. O Soneto do Carnaval
Distante o meu amor, se me afigura
O amor como um patético tormento
Pensar nele é morrer de desventura
Não pensar é matar meu pensamento.
Seu mais doce desejo se amargura
Todo o instante perdido é um sofrimento
Cada beijo lembrado uma tortura
Um ciúme do próprio ciumento.
E vivemos partindo, ela de mim
E eu dela, enquanto breves vão-se os anos
Para a grande partida que há no fim
De toda a vida e todo o amor humanos:
Mas tranquila ela sabe, e eu sei tranquilo
Que se um fica o outro parte a reuní-lo.
No Soneto de Carnaval, Vinicius de Moraes aborda o tema de um amor repleto de reencontros e despedidas. Ele começa a poesia dizendo que, mesmo sabendo que pensar na amada lhe trará sofrimento, é impossível não fazê-lo.
É como se estivesse predestinado: ano após ano, os amantes se encontram e se separam, vivendo como se cenas de um balé. Não importa quantas vezes eles partam, há sempre um desejo de se reunirem de novo, como se tivesse sido destinado desde o começo.
18. Renascendo a Esperança
Paris
De posse deste amor que é, no entanto, impossível
Este amor esperado e antigo como as pedras
Eu encouraçarei o meu corpo impassível
E à minha volta erguerei um alto muro de pedras.
E enquanto perdurar tua ausência, que é eterna
Por isso que és mulher, mesmo sendo só minha
Eu viverei trancado em mim como no inferno
Queimando minha carne até sua própria cinza.
A tristeza do poema A perdida esperança reflete o sentimento de desespero do narrador, que está profundamente abalado pela ausência de sua amada.
O poeta solitário tem a sorte de amar, mas ao mesmo tempo sofre, pois não consegue realizar seu amor. Ele não tem perspectivas de um futuro mais promissor.
Prometendo manter o amor que sente, ele sofre sozinho enquanto a amada está longe.
19. Ausência da Conjugação
Amiga! direi baixo o teu nome
Não ao rádio ou ao espelho, mas à porta
Que te emoldura, fatigada, e ao
Corredor que para
Para te andar, adunca, inutilmente
Rápida. Vazia a casa
Raios, no entanto, desse olhar sobejo
Oblíquos cristalizam tua ausência.
Vejo-te em cada prisma, refletindo
Diagonalmente a múltipla esperança
E te amo, te venero, te idolatro
Numa perplexidade de criança.
A amada que não se encontra presente é alvo de um grande elogio no trecho de Conjugação da ausente.
O poeta, mesmo na ausência da amada, continua louvando o sentimento que nutre por ela. Ainda assim, na casa vazia, encontra vestígios daquela que arrebatou seu coração.
Os dois últimos versos do poema expressam a intensidade dos sentimentos do sujeito: seu amor é tão grande que se transforma em uma espécie de adoração. Sua reação à essa profunda emoção é se assustar como uma criança.
20. Cantos do Silêncio
Ouve como o silêncio
Se fez de repente
Para o nosso amor
Horizontalmente...
Crê apenas no amor
E em mais nada
Cala; escuta o silêncio
Que nos fala
Mais intimamente; ouve
Sossegada
O amor que despetala
O silêncio...
Deixa as palavras à poesia…
O poema Duas canções de silêncio foi escrito em Oxford em 1962 e aborda a temática da contemplação diante do amor.
O poeta chama a atenção da amada para o amor que está sendo construído entre os dois, pedindo para ela ouvir o silêncio e observar com cuidado.
Convite para que ela observe, com calma, a obra de amor e carinho que os dois estão criando.