Explorando as Sete Grandes Obras de Lima Barreto


Escrito por Laura Aidar

A obra mais celebrada do escritor Lima Barreto (1881-1922) é "Triste Fim de Policarpo Quaresma".

Machado de Assis, um gênio da literatura brasileira pré-modernista, criou títulos que se tornaram clássicos da nossa literatura, como Clara dos Anjos e Recordações do Escrivão Isaías.

1. O Fim Trágico de Policarpo Quaresma (1911)

Triste fim de Policarpo Quaresma (1911)

Em 1911, o folhetim Triste fim de Policarpo Quaresma foi publicado no Jornal do Comércio. Após quatro anos, em 1915, o folhetim foi editado e se tornou livro.

Policarpo Quaresma é o protagonista dessa história. Ele era um homem comum, um funcionário público, mas nutria uma profunda lealdade à sua pátria.

Policarpo, sendo subsecretário do Arsenal de Guerra, percebe que suas opiniões ideológicas são cada vez mais importantes em sua vida. Para isso, ele aprende tupi-guarani – visando torná-lo a língua oficial –, lê apenas autores nacionais, deseja aprender a tocar modinhas no violão e cultivar as plantas típicas do Brasil.

O cada vez maior radicalismo de Policarpo acaba por torná-lo um homem cada vez mais isolado, sendo alvo de risos e zombarias de quem está à sua volta devido ao seu extremismo.

Não conseguindo se adaptar às normas sociais, Policarpo sofre consequências graves.

A obra de Lima Barreto, além de proporcionar ao leitor uma história surpreendente e envolvente, também faz uma ressonante avaliação das desigualdades sociais e da omissão do governo em relação à miséria da população. Embora as taxas sejam elevadas, a indiferença do estado frente às necessidades básicas dos mais vulneráveis é condenável.

Por esse intrincado labirinto de ruas e bibocas é que vive uma grande parte da população da cidade, a cuja existência o governo fecha os olhos, embora lhe cobre atrozes impostos, empregados em obras inúteis e suntuárias noutros pontos do Rio de Janeiro.

2. Clara dos Anjos: Uma Vida em 1922

Clara dos Anjos (1922)

O livro Clara dos Anjos, escrito por Lima Barreto em 1922, foi o último de sua obra. No entanto, foi publicado somente em 1948, muitos anos após a sua morte.

O enredo desta obra gira em torno do racismo e da posição da mulher em uma sociedade carioca permeada por preconceitos, no início do século XX.

Clara dos Anjos, uma jovem de 16 anos, é a protagonista principal nesta história. Ela é originária de um subúrbio pobre do Rio de Janeiro, e é filha de uma dona de casa e um carteiro. Cassi, um músico branco com encantos sedutores, é quem conquista o coração da menina.

Clara, uma moça jovem, mestiça e pobre, foi abandonada com um bebê no ventre, após ser engravidada pelo homem que a havia deixado. À medida que ela dava conta da sua situação marginalizada de mãe solteira excluída socialmente, seu sofrimento só aumentava.

A obra retrata o momento em que foi escrita e corajosamente trata de diversos assuntos que eram comumente tidas como tabus.

3. Revisitando a Vida e Obra do Escrivão Isaías Caminha (1909)

Recordações do escrivão Isaías Caminha (1909)

Mesmo depois da abolição da escravatura, em 1909, Lima Barreto vivenciou uma sociedade profundamente preconceituosa e hostil para com os negros, conforme evidenciou no seu livro Recordações do escrivão Isaías Caminha.

No livro, a pobreza e os moradores da região suburbano são retratados como pano de fundo. Por outro lado, o romance conta a história dos intelectuais do tempo de Lima Barreto, mostrando-os como vaidosos, mesquinhos, corruptos, hipócritas e preocupados somente com seu próprio bem-estar. É feita uma crítica frontal desses personagens.

Isaías, o protagonista mulato, se vê imerso num contexto de trabalho em uma grande redação de jornal. Embora possua amplo conhecimento cultural, está condenado a uma posição social limitada.

Isaías, cargo de contínuo no jornal O Globo, é um personagem muito ambicioso e disposto a sacrificar alguns princípios e ideais para avançar na vida. Ele navega conforme a maré, buscando um lugar na redação onde possa se destacar.

O romance, que é um precioso retrato do tempo de Lima Barreto, evidencia como o preconceito racial marcou a vida de Isaías, forçando-o a se modificar para se adaptar à realidade a que estava submetido.

Lima Barreto, filho de um tipógrafo e uma escrava liberta, compartilhava as mesmas dificuldades de seu protagonista Isaías durante sua jornada de ascensão profissional. Acreditando na meritocracia, ele se frustrava com a maneira como a sociedade funcionava.

As memórias do escrivão Isaías Caminha são uma preciosa fonte de informações para aqueles que desejam conhecer a vida social e cultural do Rio de Janeiro nos primórdios do século XX.

4. A Ninfa e Numa: Uma História de 1915

Numa e a Ninfa (1915)

Em outubro de 1914, apenas 25 dias depois de Lima Barreto deixar o Hospício, a história de Numa e Ninfa foi escrita. Lançada sob o formato de folhetim em 1915 no jornal A noite, a obra foi publicada em livro em 1917.

O livro de Lima Barreto, publicado na época, tinha como subtítulo "Romance da vida contemporânea", revelando seu intuito de descrever a sociedade e o período de sua época.

Numa Pompílio de Castro, nascido em uma família simples, lutou para se formar em Direito. Levado por seus interesses financeiros, casou-se com a influente Edgarda Cogominho, filha do eminente senador Neves Cogominho. Esta é a história narrada pelo romance.

Numa foi capaz de entrar para uma boa família, devido à ajuda do sogro, conseguiu ser eleito deputado. No entanto, tudo que conquistou foi por meio de influências e indicações, nunca por seus próprios méritos. A obra é uma crítica de Lima Barreto, que desejava uma sociedade que reconhecesse e valorizasse a meritocracia.

Apesar de não trabalhar nos primeiros 18 meses de mandato, Numa finalmente alcançou a fama tão desejada após proferir um discurso brilhante no parlamento. Estes discursos excepcionais se sucediam, mas desconheciam a verdade, que supostamente eram escritos por Edgarda, a culta mulher de Numa. Aos poucos, Edgarda começou a fazer intervenções memoráveis que o marido leria, e assim Numa foi ganhando cada vez mais notoriedade social.

Numa ficou surpreso ao descobrir que os discursos destinados à mulher haviam sido escritos pelo amante dela, o primo Benevenuto.

um herói. Após sua descoberta, Numa se viu diante de um dilema: manter a imagem de herói que seus amantes haviam criado para ele, ou arriscar-se às consequências da traição. Ele encontrava-se entre a cruz e a espada, pois dependia de seu amante para a manutenção daquela projeção.

Era o primo... Eles se beijavam, deixando de beijar, escreviam. As folhas de papel eram escritas por ele e passadas logo a limpo pela mulher. Então era ele? Não era ela? Que devia fazer? A carreira... o prestígio... senador... presidente... Ora bolas! E Numa voltou, vagarosamente, pé ante pé, para o leito, onde sempre dormiu tranquilamente.

5. Os Vivos no Cemitério (1956)

O cemitério dos vivos (1956)

A obra inacabada O cemitério dos vivos foi inspirada nas anotações que Lima Barreto fez durante seu internmento no Hospício Nacional de Alienados do Rio de Janeiro entre 1914 e 1919.

Estou no Hospício ou, melhor, em várias dependências dele, desde o dia 25 do mês passado. Estive no pavilhão de observações, que é a pior etapa de quem, como eu, entra para aqui pelas mãos da polícia. Tiram-nos a roupa que trazemos e dão-nos uma outra, só capaz de cobrir a nudez, e nem chinelos ou tamancos nos dão.

Neste texto, O cemitério dos vivos, o autor apresenta um retrato angustiante da maneira como a sociedade tratava aqueles que tinham problemas mentais. A obra é particularmente significativa para o autor, pois ela está intimamente ligada à sua própria biografia e reflete profundamente o sofrimento daqueles que lutam com distúrbios mentais.

O livro critica fortemente a forma como o meio social trata os pacientes internados em manicômios, tanto do ponto de vista médico quanto de uma perspectiva humana.

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6. Memórias de 1953: Meu Diário Íntimo

Diário íntimo (1953)

O livro Diário íntimo reflete a experiência do escritor carioca e seu envolvimento com o racismo, expondo os desafios de sua condição de intelectual e sua batalha contra os problemas psiquiátricos.

Ao ler Diário íntimo, temos a oportunidade de conhecer a trajetória pessoal de Lima Barreto, bem como ter acesso a uma fotografia significativa do Rio de Janeiro da sua geração. O autor criou um verdadeiro registro das condições da época, abordando aspectos sociais, políticos e culturais.

O autor destaca a desigualdade entre a população fluminense, com uma burguesia abastada que domina a cidade e um povo carente sendo frequentemente desrespeitado. A miséria presente na população é abordada por ele, mostrando o abismo entre as classes sociais.

Eis a narrativa do que se fez no sítio de 1904. A polícia arrepanhava torto e a direito pessoas que encontrava na rua. Recolhia-as às delegacias, depois juntavam na Polícia Central. Aí, violentamente, humilhantemente, arrebatava-lhes os cós das calças e as empurrava num grande pátio. Juntadas que fossem algumas dezenas, remetia-as à ilha das Cobras, onde eram surradas desapiedadamente.

7. A Trágica História de M: Vida e Morte

Vida e morte de M.J.Gonzaga de Sá (1919)

De acordo com o Diário íntimo, Lima Barreto começou a trabalhar em Vida e Morte de M.J. Gonzaga de Sá ainda no começo de sua carreira, em 1906. Porém, a obra só foi publicada em 1919.

Augusto Machado é o narrador-personagem desta história, guiando-nos em doze capítulos distintos. O romance trata dos deslocados Augusto Machado e Gonzaga de Sá, que se unem para enfrentar o meio que não os acolhe. Ambos são observadores da burocracia brasileira, sendo testemunhas dos conflitos que ela traz ao trabalho.

Encarcerados e distantes um do outro, os dois amigos compartilhavam as páginas de um livro discutindo acerca dos avanços da modernidade na Cidade Maravilhosa no início do século XX.

Através da análise de Augusto Machado e Gonzaga de Sá, o leitor tem a oportunidade de conhecer melhor a cidade, as relações sociais, a política da época e figuras como o Barão do Rio Branco.

faz do Rio de Janeiro a sua chácara… Não dá satisfação a ninguém… Julga-se acima da Constituição e das leis

O escritor Lima Barreto aborda diversos temas relacionados à vida urbana carioca, como a burocracia, além de dilemas éticos que se expressam através dos personagens que habitam seus contos.

Laura Aidar
Escrito por Laura Aidar

É arte-educadora, artista visual e fotógrafa. Possui licenciatura em Educação Artística pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e formação em Fotografia pela Escola Panamericana de Arte e Design.