Análise e Resumo de Vidas Secas, de Graciliano Ramos


Escrito por Carolina Marcello

Publicado em 1938, Vidas Secas, de Graciliano Ramos, é uma obra da segunda fase do modernismo, a chamada geração de 1930.

A obra, com uma escrita regionalista, conta a história de Fabiano e de sua família, retirantes do sertão nordestino, e retrata sua luta para conseguirem uma vida mais digna. Além disso, aborda a realidade da pobreza na região.

A Obra Resumida

Após serem forçados a fugir da seca devastadora na região nordestina, Fabiano, sua família e ele encontraram uma fazenda abandonada e decidiram se estabelecer ali. Em poucos dias, a chuva chegou ao sertão e logo o proprietário da fazenda apareceu. Fabiano foi então contratado como vaqueiro na propriedade.

Durante este período, Fabiano é detido, enquanto sua esposa Sinhá Vitória sonha com uma cama de couro prateado. O filho mais velho questiona palavras e o irmão mais novo se aventura a montar um cabrito.

A vida de vaqueiro acaba quando a seca força a família a partir para o sul em busca de meios de sustento.

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Examinando a obra

Em Vidas Secas, Graciliano exalta a exploração do trabalhador, retratando como Fabiano é vítima das más ações de seu patrão: ele é roubado nas contas, é submetido a preços abusivos pelos mantimentos e juros altíssimos.

Ao fim, Fabiano escapa da estiagem e da dívida que possuía com o seu empregador. Apesar de trabalhar arduamente por mais de um ano, ele ainda não tinha nada a seu nome.

Ilustração de Fabiano por Aldemir Martins

Graciliano descreve a desgraça à qual o homem desprovido se vê submetido, e sente-se mais como uma criatura animal do que como um ser humano.

O protagonista é explorado por seu patrão e oprimido pelo governo devido à sua condição de homem bruto. Embora a miséria seja gerada pelas condições da natureza (a seca), os homens não oferecem ajuda aos que mais necessitam, mas sim se aproveitam da situação.

Fabiano deseja lutar contra as desigualdades que sofre por parte do seu patrão e do soldado amarelo, porém, como um docil animal, aceita os maus-tratos. As crianças também são influenciadas por esse mesmo caminho. Devido à falta de educação, copiam o comportamento dos seus pais, ouvindo poucas palavras e recebendo muitas agressões.

A Baleia tem sonhos, e se comunica de forma eficiente com o seu corpo: o começo do livro narra seu papel em salvar a família da escassez alimentar. A descrição de seu falecimento é um dos trechos mais encantadores da prosa brasileira.

A obra é marcada por termos regionais e sua escrita é mais próxima da fala. Seguindo o mesmo padrão característico de outros romances da segunda fase do modernismo, ela aborda temáticas sociais com o objetivo de criticar e questionar.

O estilo literário em questão possui uma grande liberdade formal, proporcionando experiências narrativas inéditas. Em Vidas Secas isso é exemplificado nos capítulos desconectados entre si, como contos independentes, cada qual com sua própria narrativa.

Nesta obra, o autor apresenta personagens com características marcantes. São pessoas comuns, porém com nuances e profundidades psicológicas, que as tornam extremamente interessantes.

Literatura da Corrente

Vidas Secas é um romance que caracteriza a segunda geração do modernismo, também conhecida como geração de 30. Ele é considerado um marco do regionalismo brasileiro na literatura.

A Semana de Arte Moderna de 1922 foi um marco influente na consolidação da literatura nacional. Isso incentivou os autores a buscarem temas e personagens próprios de suas regiões para seus trabalhos. O exemplo mais notável foi o de Graciliano Ramos, que usou o sertão como inspiração para suas obras.

Histórico Contexto

Durante a década de 30, o Brasil e o mundo passaram por grande turbulência política. Nos Estados Unidos, um profundo abalo econômico se abateu sobre os cidadãos, enquanto a Europa buscava se reerguer do término da Primeira Guerra Mundial. É nesse contexto que a obra foi escrita.

Durante 1937, Getúlio Vargas assumiu o controle do Brasil por meio da instalação do Estado Novo, um regime marcado por características autoritárias e anticomunistas.

Graciliano Ramos era um marxista convicto. Durante o Estado Novo, ele foi preso por suas ideias e, em 1945, filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro.

Caracteres

A história de Fabiano

Ele é o patriarca da família, um indivíduo rude que, às vezes, parece um animal. Dialoga pouco mas manifesta-se através de grasnidos. Possui um caráter forte, a sua determinação é imensa, entretanto, sabe quando é necessário seguir e acatar as ordens.

A História de Sinhá Vitória

A mãe e o marido são pouco comunicativos. Sua maior vontade é de ter uma cama de estrutura de couro.

Filhos: Uma Bênção

O menino mais novo e o menino mais velho são os filhos.

O primeiro nutre uma admiração muito grande pelo seu pai e deseja imitá-lo. O segundo prefere as palavras e gostaria que os pais conversassem mais. Por isso, ele se aproxima mais da mãe, pois ela tem formas mais delicadas de se expressar.

A Magnificência da Baleia

Baleia é a mascote da família e é a única que consegue expressar sentimentos como um ser humano. Ela transmite suas mensagens sem precisar falar, o que é muito mais compreensível do que o que os outros membros da família tentam comunicar.

Importância dos Personagens Secundários

Além de Fabiano, outros personagens também aparecem no romance. O Soldado Amarelo é responsável por prender o protagonista de forma injusta, enquanto o patrão de Fabiano é mencionado em determinada passagem. Seu Tomás, outro personagem, é lembrado apenas nas memórias da família. Ele era abastado, inteligente e viciado em leitura, mas mesmo assim não foi protegido da seca, que o obrigou a abandonar sua fazenda.

Ilustração da Baleia por Aldemir Martins

Sumário por Capítulo

Transformação

No primeiro capítulo do livro, Fabiano, sua mulher e seus filhos são vistos vagando pelo sertão até que chegam a uma fazenda abandonada. Sem comida, água e sem meios de continuar a viagem, eles decidem se instalar ali. O capítulo termina com um ato heroico de Baleia, a cachorra, que caça um preá, salvando-os da fome.

Biografia de Fabiano

Com o fim da seca, Fabiano foi contratado como vaqueiro numa fazenda no sertão. Lá, a chuva voltou a cair. Ele se perguntava se era mesmo um homem ou se se sentia mais como um animal.

A Corrente da Cadeia

Fabiano foi à cidade buscar alimentos e acabou se envolvendo em um jogo de cartas com um soldado amarelo. Infelizmente, devido a problemas de comunicação, ele foi preso injustamente.

A História de Sinhá Vitória

Neste capítulo, Sinhá Vitória é apresentada e seu vínculo com a família é mostrado. Ela conta sobre suas tarefas domésticas enquanto o marido descansa na rede. O desejo de Sinhá Vitória é ter uma cama de armação de couro.

O Menor Menino

O menino mais novo ficou impressionado ao ver o seu pai vestido de vaqueiro montando uma égua brava. Ele sentia grande admiração e desejava imitá-lo, tentando montar numa cabra. No entanto, a empreitada não teve o resultado esperado.

O Mais Velho dos Meninos

Ele queria entender o significado da palavra "inferno", que tinha um som tão bonito. Ao questionar sua mãe, pois seu pai era muito duro, ele ficou desapontado com a resposta dela. Não acreditava que um som tão agradável pudesse se referir a um lugar tão terrível.

Ilustração do Menino mais Velho e Sinhá Vitória por Aldemir Martins

A Magia do Inverno

A chuva caiu forte, inundando o sertão. A família prendeu a respiração, temendo pela vida. No entanto, com a chegada da chuva, também vieram a esperança de que a fome e a seca não seriam mais um problema. Enquanto esperavam dentro de casa, Fabiano contava histórias improváveis, que os mantinham entretidos.

Organizando uma Festa

A família inteira se preparava para comparecer a um evento de Natal na cidade. Entretanto, quando chegaram ao destino, todos estavam descalços e com a roupa suja de lama. Fabiano embriagou-se com algumas doses de cachaça e tentou começar uma briga, mas logo adormeceu no chão, usando suas roupas como almofada. Sinhá Vitória observava as atrações da quermesse, desejando ter uma cama de verdade em casa, enquanto os meninos corriam atrás de uma cachorra.

A Maravilha da Baleia

No nono capítulo, é a cena mais memorável: Fabiano é forçado a sacrificar a cachorra que está doente. Porém, o tiro sai errado e acerta as nádegas da Baleia, que consegue fugir para o lamaçal. Ferida e à beira da morte, Baleia fica confusa, lembrando de suas responsabilidades de cuidar do gado, das crianças e da sua casa. Quando ela morre, ela sonha com um céu lindo, repleto de preás e com um Fabiano gigante.

Gerenciando Minhas Finanças

Fabiano sente-se profundamente injustiçado pelo tratamento recebido do patrão. Embora tenha direito a uma parte do gado, tem que recorrer à caridade do patrão para os demais mantimentos, que são cobrados exorbitantemente caro. Por consequência, ele gasta mais do que ganha e acaba ficando devendo ao patrão, que cobra juros. Ao mesmo tempo em que é reprimido pela revolta, Fabiano aceita suas contas com medo de ser despedido.

A Coragem do Soldado Amarelo

Ao reencontrar o soldado amarelo, Fabiano sentiu vontade de se vingar dele, mas acabou decidindo ajudá-lo a voltar para o caminho certo, já que estava sozinho e perdido nas veredas.

Um Planeta Recheado de Lágrimas

Quando Fabiano viu as aves levantando voo e se dirigindo para o sul, reconheceu que isso significava a chegada da seca. Isso o deixou muito irritado.

Escapada

A seca voltou e a fazenda não oferecia mais meios de sobrevivência. Então, a família decidiu seguir para o sul, através do sertão, em direção a uma cidade grande com maior esperança de encontrar oportunidades.

"O sertão mandaria para a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, Sinhá Vitória e os dois meninos."

A Vida Seca no Cinema

Nelson Pereira dos Santos, um dos precursores do Cinema Novo, adaptou o romance de Graciliano Ramos para o cinema em 1963.

A adaptação do livro foi tão bem sucedida que ganhou diversos prêmios e foi indicada à Palma de Ouro do Festival de Cannes em 1964.

A longa-metragem está acessível na internet.

Biografia de Graciliano Ramos

Graciliano Ramos nasceu em Quebrângulo, Alagoas, no dia 27 de outubro de 1882. Durante sua vida, atuou como escritor, jornalista e político brasileiro. Em 1953, faleceu no Rio de Janeiro.

Graciliano Ramos

Depois de terminar o ensino médio, Graciliano Ramos se transferiu para o Rio de Janeiro para trabalhar como jornalista. Contudo, em 1915, ele voltou para o Nordeste, onde viveu por mais vinte anos, até 1936, quando foi preso pelo governo Vargas. Após a soltura em 1937, ele se mudou novamente para o Rio de Janeiro, onde passou os últimos anos de sua vida até o seu falecimento.

Graciliano Ramos foi um homem que soube unir sua experiência pessoal do ambiente do sertão brasileiro com seus conhecimentos políticos para criar o romance Vidas Secas, conforme afirmou Álvaro Lins, para quem ele era "um homem do seu meio físico e social, ao mesmo tempo que um romancista voltado para a introspecção, a análise, os motivos psicológicos".

O autor foi laureado com vários prêmios de reconhecimento por sua obra, sendo que o mais importante foi o da Fundação William Faulkner (Estados Unidos), atribuído ao romance Vidas Secas como representante da Literatura Brasileira Contemporânea em 1962.

Carolina Marcello
Escrito por Carolina Marcello

Formou-se em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e possui mestrado em Estudos Literários, Culturais e Interartes pela mesma instituição. Durante os estudos universitários, foi co-fundadora do Grupo de Estudos Lusófonos da faculdade e uma das editoras da revista da mesma, que se dedica às literaturas de língua portuguesa.