Análise das 10 Músicas Mais Importantes da Bossa Nova


Escrito por Sónia Cunha

A Bossa Nova, que popularizou a música brasileira no exterior, foi fruto do avanço industrial do Brasil nas décadas de 1950 e 1960. Esse movimento contribuiu para a divulgação de nossa cultura musical para o mundo.

Os jovens compositores estavam exaustos de ouvir a mesma música, então, eles buscavam a criação de composições novas, a fim de serem adequadas aos tempos atuais.

Vamos refletir sobre as dez melhores canções que definiram aquela geração.

1. A Menina de Ipanema

A canção que rende elogios à mulher brasileira foi traduzida para o inglês e teve sua fama expandida ao ser interpretada por Astrud Gilberto.

Olha que coisa mais linda

Mais cheia de graça

É ela, menina

Que vem e que passa

Num doce balanço

A caminho do mar

Moça do corpo dourado

Do sol de Ipanema

O seu balançado é mais que um poema

É a coisa mais linda que eu já vi passar

Ah, por que estou tão sozinho?

Ah, por que tudo é tão triste?

Ah, a beleza que existe

A beleza que não é só minha

Que também passa sozinha

Ah, se ela soubesse

Que quando ela passa

O mundo inteirinho se enche de graça

E fica mais lindo

Por causa do amor

Uma linda jovem que desperta o interesse dos compositores, sem se dar conta do poder de encantamento que tem. Ela possui a capacidade de deixar todos à sua volta hipnotizados com a sua presença.

A jovem desatenta a tudo e a todos, caminhando em direção ao mar. O eu-lírico é hipnotizado pela sua presença, vendo o mundo ao seu redor de forma transformada.

2. A Dança do Avião

A letra de Antônio Carlos Jobim, composta em 1962, retrata a visão de um amante da cidade do Rio de Janeiro, observada de cima.

Minha alma canta

Vejo o Rio de Janeiro

Estou morrendo de saudade

Rio teu mar, praias sem fim

Rio você foi feito pra mim

Cristo Redentor

Braços abertos sobre a Guanabara

Este samba é só porque

Rio eu gosto de você

A morena vai sambar

Seu corpo todo balançar

Rio de sol, de céu, de mar

Dentro de mais uns minutos

Estaremos no Galeão

Este samba é só porque

Rio eu gosto de você

A morena vai sambar

Seu corpo todo balançar

Aperte o cinto, vamos chegar

Água brilhando, olha a pista chegando

E vamos nós aterrar

O eu-lírico está situado em cima de um avião, de onde pode apreciar as belezas da cidade que tanto ama. A referência a esse local faz parte do nome "Samba do Avião".

A letra sugere que o compositor carioca está retornando de uma longa viagem e ansioso para sentir o conforto de seu lar.

O sujeito poético faz referência às maravilhas da cidade, como o Cristo Redentor, a Baía de Guanabara, o clima, as praias, a música, as mulheres e a atmosfera. Ele consegue captar tudo o que o faz sentir saudades e saudade é o que ele menciona.

3. Desafinado: Uma Canção Fora de Tom

A canção de Antônio Carlos Jobim e Newton Mendonça, feita famosa por João Gilberto, ganhou fama mesmo sendo acompanhada por uma acusação de desafinação.

Se você disser que eu desafino amor

Saiba que isto em mim provoca imensa dor

Só privilegiados tem o ouvido igual ao seu

Eu possuo apenas o que deus me deu

Se você insiste em classificar

Meu comportamento de anti-musical

Eu mesmo mentindo devo argumentar

Que isto é Bossa Nova, isto é muito natural

O que você não sabe nem sequer pressente

É que os desafinados também tem um coração

Fotografei você na minha Rolley-Flex

Revelou-se a sua enorme ingratidão

Só não poderá falar assim do meu amor

Ele é o maior que você pode encontrar

Você com a sua música esqueceu o principal

Que no peito dos desafinados

No fundo do peito

Bate calado, que no peito dos desafinados

Também bate um coração.

O eu-lírico se defende acusado de desafinar para a amada, argumentando que ela possui um ouvido extremamente sensível. Contudo, afirma que tal ato é muito comum na Bossa Nova. Esta é tão referenciada na letra que, inclusive, tem seu movimento inserido.

A máquina fotográfica Rolley-Flex, tão popular no período, é uma presença destacada na letra, conferindo-lhe um toque moderno.

4. Ineficácia da Insensatez

A canção Insensatez, composta em 1961 por Vinicius de Moraes e Tom Jobim, traz consigo um tom mais triste e lamentoso.

A Bossa Nova é um ícone que foi immortalizado na música, sendo gravada por importantes artistas como Ella Fitzgerald, Frank Sinatra e Iggy Pop, inclusive em uma versão em inglês intitulada "How Insensitive".

A insensatez que você fez

Coração mais sem cuidado

Fez chorar de dor

O seu amor

Um amor tão delicado

Ah, porque você foi fraco assim

Assim tão desalmado

Ah, meu coração quem nunca amou

Não merece ser amado

Vai meu coração ouve a razão

Usa só sinceridade

Quem semeia vento, diz a razão

Colhe sempre tempestade

Vai, meu coração pede perdão

Perdão apaixonado

Vai porque quem não

Pede perdão

Não é nunca perdoado

O desamor é a triste inspiração de um clássico da Bossa Nova. O narrador, atormentado por seu coração partido, expressa a dor deste mal de amor.

De acordo com Vinicius, quando não semeamos coisas boas, as consequências chegam rapidamente. O sujeito poético parece ter cometido um erro com a amada, e, durante a letra, é encorajado a se desculpar, na esperança de que tudo volte ao normal.

5. Onda

Tom Jobim e Vinicius de Moraes, parceria responsável pelo nascimento de Wave - primeira faixa do álbum lançado em 1967 -, contaram com o auxílio do arranjador Claus Ogerman para dar forma a essa obra-prima.

Vou te contar,

Os olhos já não podem ver

Coisas que só o coração pode entender.

Fundamental é mesmo o amor,

É impossível ser feliz sozinho.

O resto é mar,

É tudo que eu não sei contar.

São coisas lindas

Que eu tenho pra te dar.

Vem de mansinho a brisa e me diz:

É impossível ser feliz sozinho.

Da primeira vez era a cidade,

Da segunda, o cais e a eternidade.

Agora eu já sei

Da onda que se ergueu no mar,

E das estrelas que esquecemos de contar.

O amor se deixa surpreender,

Enquanto a noite vem nos envolver.

Vou te contar,

Os olhos já não podem ver

Coisas que só o coração pode entender.

Fundamental é mesmo o amor,

É impossível ser feliz sozinho.

O resto é mar,

É tudo que eu não sei contar.

São coisas lindas

Que eu tenho pra te dar.

Vem de mansinho a brisa e me diz:

É impossível ser feliz sozinho.

Da primeira vez era a cidade.

Da segunda, o cais e a eternidade.

Agora eu já sei

Da onda que se ergueu no mar,

E das estrelas que esquecemos de contar.

O amor se deixa surpreender,

Enquanto a noite vem nos envolver.

Vou te contar...

O nome da canção "Wave" não é aleatório: além de retratar o cenário da praia, a melodia apresenta a mesma cadência das ondas do mar e tem um ritmo marcante.

O sentimento amoroso costuma se desenvolver por meio de um movimento cíclico de aproximações e afastamentos, muitas vezes chamado de onda. Esta onda pode representar diversas fases deste sentimento.

A canção "Wave" é um verdadeiro hino à Bossa Nova. Ela fala sobre o encantamento do amor, a beleza de se sentir apaixonado, a intimidade com a pessoa amada e a tranquilidade e leveza da paisagem costeira, que servem como pano de fundo.

A famosa frase "É impossível ser feliz sozinho" está associada ao movimento Bossa Nova e à letra de uma música imortalizada por esse estilo musical. Entretanto, ela transcendeu esses limites, tornando-se parte da cultura popular e do imaginário coletivo.

6. Brilhando Através dos Seus Olhos

Uma peculiar canção, composta por Vinicius de Moraes e Tom Jobim, chamou-se conhecida pelas vozes de Miúcha e Tom Jobim. O casal interpretou cada parte da música, a qual não tem refrão.

Quando a luz dos olhos meus

E a luz dos olhos teus

Resolvem se encontrar

Ai, que bom que isso é, meu Deus

Que frio que me dá

O encontro desse olhar

Mas se a luz dos olhos teus

Resiste aos olhos meus

Só pra me provocar

Meu amor, juro por Deus

Me sinto incendiar

Meu amor, juro por Deus

Que a luz dos olhos meus

Já não pode esperar

Quero a luz dos olhos meus

Na luz dos olhos teus

Sem mais lararará

Pela luz dos olhos teus

Eu acho, meu amor

E só se pode achar

Que a luz dos olhos meus

Precisa se casar

Há nada comparável ao sentimento de estar apaixonado? A Pela Luz Dos Olhos Teus deseja capturar essa preciosa experiência e expressá-la em palavras, retratando o amor.

Miúcha e Tom interpretam essa música para expor os dois lados de uma relação de afeto. Na letra, assistimos às diversas nuances de uma relação amorosa: os apaixonados conseguirão resistir? Serão capazes de ficar juntos para sempre?

É importante destacar que essa música aborda não apenas o aspecto da atração física, mas também as manifestações corporais que se manifestam nos corações dos enamorados.

7. Ela é da Cidade Maravilhosa

Uma homenagem à mulher carioca, esse é o tema da canção criada em parceria entre Tom Jobim e Vinicius de Moraes.

Ela é carioca

Ela é carioca

Basta o jeitinho dela andar

Nem ninguém tem carinho assim para dar

Eu vejo na cor dos seus olhos

As noites do Rio ao luar

Vejo a mesma luz

Vejo o mesmo céu

Vejo o mesmo mar

Ela é meu amor, só me vê a mim

A mim que vivi para encontrar

Na luz do seu olhar

A paz que sonhei

Só sei que sou louco por ela

E pra mim ela é linda demais

E além do mais

Ela é carioca

Ela é carioca

A Bossa Nova nasceu no Rio de Janeiro e a mulher carioca é considerada seu ícone. A letra dessa canção é um elogio à jovem e também uma convocação para que se admire a cidade de maneira agradável.

A mulher retratada na letra de Vinicius é idealizada como alguém que possui um olhar carinhoso, uma personalidade marcante e um caminhar único. O fato de ter nascido no Rio de Janeiro só aumenta ainda mais sua encantadora beleza, a ponto de hipnotizar o eu-lírico do poema, que criou uma composição só para ela.

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8. Adeus à Saudade

Vinicius de Moraes e Tom Jobim se uniram para compor uma canção em 1956, que viria a se tornar um dos maiores clássicos da Bossa Nova.

A música Chega de Saudade foi um dos primeiros sucessos do movimento bossa nova, aparecendo em 1958, no álbum Canção do Amor Demais, de Elizeth Cardoso. Esta música também se tornou famosa ao ser regravada, pela primeira vez, pelo artista João Gilberto, no seu primeiro disco solo de mesmo nome.

Vai minha tristeza

E diz a ela que sem ela não pode ser

Diz-lhe numa prece

Que ela regresse

Porque eu não posso mais sofrer

Chega de saudade

A realidade é que sem ela

Não há paz

Não há beleza

É só tristeza e a melancolia

Que não sai de mim

Não sai de mim

Não sai

Mas

Se ela voltar

Se ela voltar

Que coisa linda!

Que coisa louca!

Pois há menos peixinhos a nadar no mar

Do que os beijinhos

Que eu darei na sua boca

Dentro dos meus braços, os abraços

Hão de ser milhões de abraços

Apertado assim, colado assim, calado assim,

Abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim

Que é pra acabar com esse negócio

De viver longe mim

Não quero mais esse negócio

De você viver assim

Vamos deixar esse negócio

De você viver sem mim

Não quero mais esse negócio

De viver longe de mim.

Chega de Saudade é conhecida por seu choro melancólico e conta, com seu título enigmático, a história de um desencontro amoroso. Esta canção, que se tornou um símbolo da Bossa Nova, retrata as emoções do sujeito poético e sua angústia diante da perda.

O eu-lírico expressa uma profunda tristeza causada pela ausência da amada. Ele pede que ela volte, pois é a única que pode trazer de volta a felicidade que ele sentia antes de sua partida. A mulher é vista como a única fonte de alegria, e seu afastamento causa um sofrimento que o eu-lírico não consegue suportar.

9. As Águas de Março

Tom Jobim compôs a música Águas de Março em 1972, que logo se tornou famosa quando foi gravada em 1974 para o LP Elis & Tom, com a colaboração da cantora Elis Regina.

É pau, é pedra, é o fim do caminho

É um resto de toco, é um pouco sozinho

É um caco de vidro, é a vida, é o sol

É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol

É peroba do campo, é o nó da madeira

Caingá candeia, é o Matita-Pereira

É madeira de vento, tombo da ribanceira

É o mistério profundo, é o queira ou não queira

É o vento ventando, é o fim da ladeira

É a viga, é o vão, festa da cumeeira

É a chuva chovendo, é conversa ribeira

Das águas de março, é o fim da canseira

É o pé, é o chão, é a marcha estradeira

Passarinho na mão, pedra de atiradeira

Com sua letra grande e detalhada (o que você leu acima é somente o início da canção), é surpreendente que uma música difícil de ser cantada tenha se tornado tão popular tão rapidamente.

Águas de Março foi reconhecido como um sucesso duradouro, tendo sido eleito, em 2001, pela Folha de SP, a melhor canção brasileira de todos os tempos, segundo uma pesquisa realizada.

A letra desta canção descreve uma sucessão de situações que deixam o intérprete (e quem está ouvindo) ofegante.

Tom contou, em entrevista, que a canção surgiu depois de um cansativo dia de trabalho no interior do Rio de Janeiro. Enquanto construía uma casa maior, no alto de um morro, ele se encontrava em sua pequena casa de férias, com a família.

A inspiração inesperada fez com que o compositor rabiscasse a letra extensa em um pedaço de papel. Águas de Março possui uma profunda carga imagética e por meio de uma enumeração quase desorganizada, cria uma narrativa sobre um determinado mês e desenha um cenário ainda em construção. Nesta letra, elementos concretos e abstratos se fundem para a composição da cena.

10. Samba em Um Acorde Só

Tom Jobim e Newton Mendonça uniram-se para criar o Samba de uma Nota Só. Esta composição foi também adaptada para o inglês, recebendo o nome de One Note Samba.

Eis aqui este sambinha

Feito numa nota só,

Outras notas vão entrar

Mas a base é uma só.

Essa outra é consequência

Do que acabo de dizer

Como sou a consequência inevitável de você.

Quanta gente existe por aí

Que fala tanto e não diz nada,

Ou quase nada.

Já me utilizei de toda escala

E no final não sobrou nada,

Não deu em nada

Curioso notar que, ao longo da carta, há a tratativa sobre o seu processo de composição. O que está escrito acima não é mais do que apenas um breve trecho.

Esta canção é metalinguística, pois se refere à própria circunstância de sua composição. Ela se volta para o seu próprio contexto, falando sobre o processo de criação.

A letra faz uma comparação entre a produção musical e a conquista amorosa. De acordo com a percepção do eu-lírico, é bastante difícil encontrar a nota e a melodia certas, mas também é impossível conter a louvação à amada.

Explorando a Bossa Nova

Durante os anos 50, a Bossa Nova se originou principalmente nos lares dos seus compositores e nos bares.

Durante esse período histórico, houve grande ebulição cultural e transformações sociais. Os jovens compositores se esforçaram para alcançar uma nova forma de compor música, mais ajustada ao cenário da época.

Em 1958, Elizeth Cardoso cantou Canção do Amor Demais, escrita por Tom Jobim e Vinicius de Moraes, com João Gilberto acompanhando no violão. Dois anos depois, em 1959, foi lançado o disco Chega de Saudade, de João Gilberto, tendo como composição novamente Tom e Vinicius. Esses dois discos marcaram o início da Bossa Nova.

Os principais protagonistas deste movimento são:

  • - Antonio Carlos Jobim (1927-1994)
  • - Vinicius de Moraes (1913-1980)
  • - João Gilberto (1931)
  • - Carlos Lyra (1933)
  • - Roberto Menescal (1937)
  • - Nara Leão (1942-1989)
  • - Ronaldo Bôscoli (1928-1994)
  • - Baden Powell (1937-2000)

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Sónia Cunha
Escrito por Sónia Cunha

É licenciada em História, variante História da Arte, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (2003) e em Conservação e Restauro pelo Instituto Politécnico de Tomar (2006). Ao longo da carreira profissional, exerceu vários cargos em diferentes áreas, como técnico superior de Conservação e Restauro, assistente a tempo parcial na UPT e professora de História do 3º ciclo e ensino secundário. A arte e as letras sempre foram a sua grande paixão.